Terça-feira, 2005-09-20 22:09:47
Ao início do dia de hoje ficámos presos em Angolares durante cerca de uma hora para resolver alguns problemas burocráticos e de logística da missão. Não é muito agradável, já que estamos aqui para exercer actividade médica, mas são coisas que fazem parte da missão.
Partimos em direcção ao posto de Ribeira Peixe, onde fiquei com o Dr. Ricardo Leitão a fazer as consultas. O Dr. Stepan Harbuz seguiu para os postos de Monte Mário e Emolve (postos com menos doentes). Em Ribeira Peixe tínhamos dezanove doentes à espera. Durante as consultas tive alguns doentes com quem foi excepcionalmente difícil comunicar. Não é muito frequente isto acontecer, mas hoje tive de pedir várias vezes à agente de saúde comunitária para servir de intérprete; parecia que algumas pessoas não sabiam falar português.
Dos casos de hoje destaco três. O primeiro, uma jovem de 19 anos com uma infecção urinária alta. Encontrava-se com sintomas há dois meses, mas apenas hoje veio à consulta. Este caso serve para ilustrar alguma tendência das pessoas de S. Tomé para evitar a ida ao médico, deixando evoluir a sua doença para estados mais graves do que se fossem tratados inicialmente. Foi este o caso, o que começou com uma infecção urinária [baixa] simples, evoluiu para uma infecção urinária alta, bem mais grave. O segundo caso foi uma senhora de 58 anos com hipertensão, que veio por dores lombares, que eram o problema menos grave. A doente tinha terminado a medicação para a hipertensão há três meses e hoje estava com uma tensão arterial de 194/82 (o normal é até 130/80). Por vezes é difícil fazer compreender às pessoas (mesmo em Portugal) que a hipertensão é uma doença grave e que não podem suspender a medicação por auto-iniciativa porque esta atitude pode ser muito perigosa. Finalmente, o terceiro caso interessante foi o de uma menina de dois meses, cuja mãe tinha escorregado e caído enquanto a transportava. A menina bateu com a cabeça no chão e perdeu a consciência durante alguns minutos. Isto tinha ocorrido há já quatro dias, tendo a mãe recorrido ao posto de saúde de Ribeira Peixe, onde a agente de saúde lhe desinfectou a ferida e fez um penso. O que mais estranhámos foi que ninguém se tinha lembrado de nos chamar perante uma situação tão grave! Apenas quatro dias depois estávamos a ver a menina. Apesar disso, a mãe não tinha notado nenhuma alteração do comportamento desde a queda nem lhe notamos nenhuma alteração quando a observámos. Contudo, sem qualquer meio auxiliar de diagnóstico disponível e para podermos assegurar alguma vigilância e cuidado adequado da ferida da cabeça, transportámo-la e à mãe para o hospital de Angolares, onde ficaram internadas por um período curto, para podermos verificar se o traumatismo teve consequências neurológicas.
Antes de partir, deixámos em Ribeira Peixe alguns caixotes de roupa e calçado e duas bolas de futebol para os jovens.
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