Terça-feira, 2005-10-11 21:10:55
Antes de sair de Angolares carregámos treze caixotes de roupa e brinquedos para distribuir nos Postos Comunitários de Saúde. A primeira paragem foi em Ribeira Peixe, onde fizemos vinte e uma consultas. O que achei mais engraçado foi o medo que as crianças tinham de mim. Ir ao médico é um acontecimento algo assustador para a maioria das crianças, mas nem o facto de nós nem sequer usamos bata parece ajudar. É que além de virem ao médico, estas crianças têm outro motivo para terem medo: há um colomba a querer tocar-lhes. Colomba é o termo da língua Angolar que designa os brancos. Muitas das povoações do distrito de Caué são bastante remotas e isoladas, de maneira que estas crianças raramente vêem homens brancos. Até já houve casos com as primeiras equipas da AMI em que as crianças da povoação fugiam quando os jipes chegavam com o médico. Hoje em dia o contacto na rua é bastante fácil, as crianças procuram os brancos pedindo “Doce, doce, doce!” (recentemente existe outra variação, especial para a equipa da AMI, em que o grito é “Bola, bola, bola!”, uma vez que temos distribuído algumas bolas de futebol). Contudo, no espaço confinado do “gabinete médico” (entre aspas para o espaço onde fazemos consultas não se confundir com um gabinete médico a sério, que só existe no hospital e em Porto Alegre) e perante a eminência de um contacto físico próximo, o choro é uma reacção quase inevitável.
Em Emolve tínhamos cinco doentes. Um deles era uma menina de três anos com uma crise asmática que medicamos apenas com fármacos por via oral, pois não temos bombas inaladoras. Ainda ponderamos enviá-la à urgência do hospital de Angolares, mas lembrámo-nos que lá não tínhamos muito mais para oferecer, não há oxigénio nem aerossóis. Antes de partir deixámos uma bola de futebol às crianças. Ficaram tão contentes com a prenda que até nos bateram palmas!
Em Monte Mário fizemos cinco consultas. O mais engraçado foi o grande ajuntamento de pessoas, principalmente crianças, que se criou quando viram passar os jipes com caixotes de roupa. Deixámos os caixotes à guarda do professor primário, que nos parece ser uma pessoa honesta e que distribuirá o seu conteúdo de forma justa. Mesmo assim as crianças não desarmaram, continuaram à nossa volta a pedir coisas. No entanto há uma maneira muito eficaz de entreter estes miúdos: fotografias. Todas as crianças pedem para lhes tirarmos uma foto. Depois é uma alegria desmedida quando mostramos o resultado no visor da máquina. Após algumas tentativas falhadas, lá conseguimos juntar todos para uma foto de grupo com os médicos da AMI.
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