Sábado, 2005-10-15 21:10:54
A manhã de trabalho foi hoje bastante curta. No hospital estava apenas uma doente internada: a senhora da dor abdominal de quem falei ontem. Com a medicação que lhe prescrevi ontem ao fim do dia, sentia-se um pouco melhor e tinha conseguido dormir durante a noite. Mantinha ainda alguma dor, mas a observação do abdómen era um pouco menos dolorosa que ontem. Fizemos alguma medicação para as dores e mantivemos a doente sob observação.
Feito o trabalho no hospital, fomos comprar gasóleo para o nosso gerador. Já não há electricidade na nossa metade de Angolares há uma semana. Existem dois geradores que fornecem a electricidade à cidade, mas temos o azar de a nossa casa ficar na metade que é abastecida pelo gerador que está sempre a avariar. O que nos vai valendo é termos o nosso próprio gerador a gasóleo, ao qual recorremos com frequência para ligar o frigorífico (ou já se teriam estragado a maior parte dos alimentos), os computadores e ter luz à noite.
Seguimos depois para a Praia Micondô, mas não estivemos lá mais de trinta minutos. Estava a descascar cocos quando a chuva nos expulsou da praia. Ainda assim, o Dr. Stepan conseguiu negociar com algumas crianças o transporte até ao carro dos cocos que tínhamos recolhido. Em troca receberam um pacote de bolachas e um garrafão de água (queria o garrafão não pela água que continha, mas por ser um recipiente limpo onde podem transportar água da fonte até casa).
Passei a tarde a estudar e a fazer algumas modificações no site. À noite, enquanto esperava a transmissão do jogo entre Porto e Benfica (que, para nossa desilusão, foi interrompida com menos de quinze minutos de jogo por dificuldades de recepção do sinal de satélite), vi no telejornal uma notícia que vale a pena relatar. Há uma menina de um ano de idade internada no hospital da capital com hidrocefalia (uma condição em que há um aumento do líquido dentro da cavidade craniana o que, nas crianças, faz com que a cabeça cresça de forma muito desproporcionada). Por não existirem meios para a tratar em S. Tomé, esta menina está há vários meses há espera de ser evacuada para Portugal. Entretanto a sua situação agrava-se. Este é um exemplo ilustrativo do que se passa com o envio de doentes para tratamento em Portugal. Se um doente não pode ser tratado em S. Tomé por falta de meios, é proposta a sua evacuação para Portugal ou para o Gabão. Para que isso aconteça, precisa de ser submetido a uma Junta Médica, que habitualmente demora alguns meses até realizar a avaliação e ainda mais tempo para autorizar (ou não) a evacuação. Depois disso é necessário que a embaixada de Portugal conceda os vistos de entrada no país e receba autorização para que o tratamento seja feito num hospital português. É frequente o processo demorar um ano ou mais até que finalmente o doente seja enviado para Portugal. Para agravar a situação, a política da embaixada (sem dúvida decidida a nível central pelo governo português) é restringir as evacuações médicas ao mínimo indispensável. É que o tratamento da maior parte destes doentes é bastante caro e muitas vezes os custos não são pagos pelo país de origem e recaem sobre o orçamento do Ministério da Saúde português. É mais uma injustiça no rol das que separam ricos e pobres.
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