Missão S. Tomé e Príncipe - Diário de Viagem, por Daniel Pinto
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Terça-feira, 2005-10-18 21:10:32

Hoje foi um dia em que o nosso jipe transportou imensas pessoas. Começou logo de manhã por levar o funcionário do hospital que vende os medicamentos, o funcionário que faz a estatística e o enfermeiro do posto de Emolve. Tínhamos decidido deixar o Nissan Patrol a descansar pois ultimamente tem furado com grande frequência (provavelmente precisa de pneus novos) e sempre poupamos algum combustível. Ao contrário do que é habitual, fomos primeiro ao posto de Emolve para deixar o enfermeiro. Aqui, além do enfermeiro que é hipertenso, não existiam mais doentes com consulta hoje.
Seguimos para Ribeira Peixe, onde fizemos treze consultas. Notei que a agente de saúde comunitária envergava roupas novas, sem dúvida retiradas das que lhe tínhamos entregue para distribuir há uma semana. À saída da povoação ganhámos mais um passageiro: um senhor com a perna engessada que ia para o hospital de Angolares.
A paragem seguinte foi em Monte Mário, onde oferecemos uma bola de futebol às crianças da escola primária e fizemos quatro consultas. Um dos doentes tinha feito uma ferida no pé, que agora estava seriamente infectado. Explicámos-lhe que teria de ir para o hospital de Angolares para fazer antibióticos endovenosos. O doente informou-nos que provavelmente não conseguiria transporte até Angolares, contudo, já tínhamos o carro cheio. Combinamos que amanhã pararemos em Monte Mário no regresso de Porto Alegre para o trazer. Entretanto ficará a fazer um antibiótico oral para evitar que a situação progrida ainda mais.
Recebemos ainda um pedido para ir ver uma doente a casa. Tratava-se de uma jovem de vinte e quatro anos que apresentava um comportamento estranho. Seguimos a mãe da jovem, que nos conduziu a uma pequena casa construída em madeira. A doente não estava muito colaborante, falava muito pouco e tinham de ser os pais a explicar a situação. Desde há alguns dias que passava a noite acordada, sempre a rir, dizendo coisas com pouco sentido e recusava-se a ir ao médico. Outras vezes sentia-se muito triste e já tinha estado internada por uma situação psiquiátrica que os pais não sabiam explicar. Pareceu-me que se tratava de uma doente bipolar em fase maníaca. Como não tinha nenhum medicamento adequado para a tratar (apenas dispomos de um fármaco de segunda linha, mas não o tínhamos connosco), consegui acordar com a doente que viria à consulta na próxima semana.
Na viagem de regresso parámos em Dona Augusta e Iô Grande para recolher os livros de registo das consultas. É a partir destes livros que fazemos a estatística da nossa actividade, mas estão a surgir algumas dificuldades relativamente aos dados que nos são apresentados pelos funcionários do hospital. Depois de almoço ia-me sentar com o funcionário responsável pela estatística para vermos os dados em conjunto. Quando chegámos a Angolares o senhor da perna engessada a quem tínhamos dado boleia ofereceu-nos dois belos limões como agradecimento.
Depois de almoço passei pelo armazém da AMI para levar algumas embalagens de soro de rehidratação oral, que o hospital já não tinha; e carregar alguns caixotes de roupa e calçado para distribuir na roça de S. João. Segui depois para o hospital, onde estive a analisar os dados estatísticos das nossas consultas. Estava à volta dos números há cerca de uma hora quando a enfermeira me veio chamar para ver uma urgência que tinha chegado. E que urgência! Era um homem de 73 anos com uma hérnia inguinal encarcerada (uma parte do intestino tinha ficado preso no orifício da hérnia). Esta é uma situação que geralmente apenas é resolvida com uma intervenção cirúrgica de urgência. A dor tinha começado por volta das duas da tarde e eram então quase quatro horas. O doente tinha de seguir rapidamente para a capital, onde podia ser operado. No entanto a ambulância do hospital estava com o Dr. Américo em Porto Alegre (a preparar as cerimónias de amanhã), a cerca de uma hora de distância. Fiz rapidamente algumas contas de cabeça: a hérnia estava encarcerada há quase duas horas, uma hora para a ambulância chegar a Angolares, mais uma hora para levar o doente até ao hospital central e pelo menos outra hora até a cirurgia começar. Cinco horas com a hérnia encarcerada não eram aceitáveis. Mandei a enfermeira fazer ao doente medicação analgésica e fui rapidamente à roça de S. João deixar os caixotes de roupa para distribuir. À porta de casa encontrei uma enfermeira portuguesa e o marido, que estão de férias em S. Tomé e queriam conversar um pouco com a equipa da AMI. Com bastante pena, expliquei que não havia tempo devido à urgência que tínhamos em mãos. Entrei para chamar o Dr. Stepan (que, quando viu o doente, foi da mesma opinião – precisava de ir rapidamente para o hospital central) e seguimos com o doente para a capital. Foi uma viagem feita com alguma velocidade, procurando equilibrar a urgência da situação com os inúmeros buracos na estrada que maltratavam o doente (e também o nosso jipe). Quem já passou por uma situação semelhante sabe como cada ressalto da estrada agrava a dor que se sente. Uma hora (e muitos peões a reclamar com a nossa velocidade) depois chegámos ao hospital, onde entregámos o doente aos médicos de urgência.
O regresso a Angolares fez-se de forma bem mais calma. Ao jantar, uma bem merecida posta de peixe fumo.

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